Salve, Gloria - Reportagem da Revista Isto É GENTE
Com o filme Flores Raras, Gloria Pires comemora seus 45 anos de carreira como uma das mais respeitadas atrizes do País e a maior de sua geração. Aos 50 anos, avança mais um passo ao atuar em inglês no cinema, impressionar críticos mundo afora e ser apontada como uma das possíveis indicações ao Oscar de Melhor Atriz
Simone Blanes
Fotos Daryan Dornelles
Styling Márcia Maia
Beleza Érica Monteiro
Em uma de suas mais célebres frases, o poeta francês Victor Hugo disse que “a verdadeira glória repousa em convencer”. Mais de 100 anos depois, ver uma cena de Gloria Pires no cinema, como a arquiteta Lotta de Macedo Soares em Flores Raras, mostra o quanto isso é verdadeiro. Talvez, não por coincidência seu nome seja Gloria. Mas o que realmente sempre a cobriu de glórias em sua carreira é sua genialidade na atuação.
Em qualquer um dos papéis que se propõe a fazer, na televisão ou no cinema, comprova até mais do que a simples capacidade de convencer. Ela é capaz de dar vida às personagens de forma tão intensa, quase como se ali não existisse uma atriz, e, assim, nos emocionar e nos fazer realmente entrar naquela história e acreditar naquela pessoa, como se fosse real. Detalhe: sendo a personagem fictícia ou não, como é o caso de Lotta. “O que me encantou na Lotta foi sua entrega, a visão à frente de seu tempo, sua energia de amor”, diz Gloria, que, mais do que convencer, também encanta. E o faz pelos mesmos motivos enumerados pela atriz para definir a arquiteta brasileira.
Sempre foi assim: com Maria de Fátima (Vale Tudo, 1988); as gêmeas Ruth e Raquel (Mulheres de Areia, 1993); Maria Moura (Memorial de Maria Moura, 1994), Peirina (O Quatrilho, 1995), Dona Lindu (Lula, o Filho do Brasil, 2010), e tantos outros papéis emblématicos de sua bem-sucedida carreira. Agora é assim com Lotta, que ganhou vida pelas mãos da atriz no filme de Bruno Barreto. O longa reconstitui a história de amor da arquiteta idealizadora do Parque do Flamengo com a poetisa americana Elizabeth Bishop, interpretada pela australiana Miranda Otto, no Brasil dos anos 50. “Esse trabalho aconteceu num momento em que tudo convergia para que acontecesse de forma perfeita”, diz ela. “Foi um momento de maturidade, de muita vontade de realizar e com uma equipe comprometida e apaixonada pela história.”
Flores Raras veio como um desafio para a atriz, após 17 anos de espera. Em 1995, Lucy Barreto leu Flores Raras e Banalíssimas, de Carmem L. Oliveira (Ed.Rocco), e ligou para Gloria, convidando-a para o papel de Lotta. Só em 2001, ao se encantar com a peça Um Porto para Elizabeth Bishop, de Marta Góes, Bruno Barreto decidiu fazer o filme. Amy Irving, com quem ele era casado, protagonizou o monólogo em Nova York.
Além de coroar seus 45 anos de carreira, o filme mostra mais um lado da extraordinária capacidade de Gloria em atuar: a maior parte é falada em inglês. “Existia, sim, esse fator desafiante de interpretar em outro idioma. E a expectativa de como seria recebido pelo público”, conta Gloria, até pela questão de sua personagem ser homossexual. Mas o filme passa uma sobriedade acima da polêmica. “Até porque não era essa a intenção. Estreou num momento em que havia muita discussão em torno dos direitos civis dos homossexuais e, por isso, acho que fez com que as pessoas assistissem sem pre-conceito”, diz a atriz.
O próximo passo? “A série Doctor Pri, que começaremos a gravar em março. Estou muito empolgada porque nunca participei de uma série antes”, completa.
Chave de ouro
Com chave de ouro é como Gloria Pires encerra o ano de 2013. Eleita a PERSONALIDADE DO ANO, por Gente, ela ainda pode ser indicada ao Oscar, por sua atuação em Flores Raras. Porém, “Sem expectativas!”, pontua. Apostas e opiniões já estão na mesa para a lista de nomeados que sai em janeiro de 2014. Aguinaldo Silva é um dos maiores entusiastas. “A nomeação de Gloria seria mais que justa. Ela é a maior atriz de sua geração e uma das maiores do Brasil”, disse o autor em seu Twitter.
Nem mesmo vencer o desafio de atuar em inglês ou uma possível indicação ao Oscar animam a atriz a investir em Hollywood. “Adoraria, mas teria que passar ao menos seis meses nos Estados Unidos, o que seria inviável”, diz. Gloria é superesposa e mãe. Quer estar perto do marido, Orlando Morais, e dos filhos, Cleo, Antonia, Ana e Bento. O caçula, como as irmãs, já demonstra talento para as artes. “Minha casa é um ambiente artístico por natureza, mas, desde que coloquei o piano na sala, há música o tempo todo, seja pelo Orlando, Antônia, Ana ou Bento. Aí, quando chega a Cleo, a bagunça fica completa!” E como manter o equilíbrio sendo essa supermulher? “Namoro o zen desde a adolescência. Leio sobre o taoísmo e coisas do gênero”. Cleo já disse: “Chamo minha mãe de Buda, de tão zen que ela é”. Gloria explica. “A primeira coisa que se aprende é o que Lavousier já tinha percebido: na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma. É simples, mas difícil de ser vivenciado.”
Cheia de Gloria
Quando Gloria nasceu, em 1963, no Rio, sua mãe, Elza Marques Pires, talvez não tivesse suposto o quanto o nome que deu à filha traduziria o que ela significaria para a cena brasileira. Nem mesmo no sonho da menina de 5 anos ao estrear na TV Excelsior, em 1969, na novela A Pequena Orfã (1968). Mas foram os pais seus maiores incentivadores. “Eles eram amorosos e sinceros, e me ensinaram a pensar e viver de acordo com meus princípios.”
Hoje, aos 50 anos, no Olimpo da tevê brasileira, Gloria transformou sua carreira em um festival de aplausos, sem nunca ter pisado em um palco de teatro. Um caminho nem sempre tão fácil. “Eu não era a menina bonita, não tinha um sobrenome influente, nem grana”, conta. “Porém, vivia em um ambiente culturalmente muito rico. O bom não existe sem o ruim.” Mas talento não se teoriza, explica ou justifica. Apenas se aprecia, admira, contempla. E o que dizer mais de Gloria? Gloria é a glória.
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