Nos 70 anos da TV, Gloria Pires e Tony Ramos relembram perrengues de bastidores: de ataque de cupim a cóccix quebrado
Por: Naiara Andrade
Há pouco mais de 50 anos, dos 70 da TV no Brasil, Tony Ramos e Gloria Pires são recebidos nas casas de milhões de brasileiros, contando as mais diversas histórias, com as mais variadas aparências. Trata-se de uma intimidade tão mágica, que é capaz até de mudar a relação dos atores com pessoas que realmente lhe são próximas.
— No momento em que entro numa novela, gente com quem eu lido no meu dia a dia passa a me olhar de um jeito diferente. É muito interessante isso — comenta Gloria, aos 57 anos, cuja primeira aparição na telinha foi aos 4, na trama “A pequena órfã”, da Excelsior: — Eu tinha que subir num tablado, fazer um charme e sorrir. Quando percebi um monte de gente me olhando, fiquei apavorada, desci tremendo que nem vara verde. Para piorar, tive uma hemorragia nasal na cena com a vilã da história. Aí interromperam a minha participação no que hoje seria o elenco de apoio da novela.
Como ele relembra em detalhes, Tony, de 72 anos, que não começou criança, “mas um adolescente, na TV Tupi, em 29 de junho de 1964, no programa ‘Novos em foco’”, também saiu de seu primeiro “ao vivo” com as pernas bambas. E coleciona histórias curiosas de bastidor. Como refletores que superaqueceram e estouraram, como tiros, em meio a uma cena romântica, que precisou ser toda refeita, já que na época não havia como editar e era necessário gravar toda a sequência de novo.
— Em “Grande Sertão: veredas” (1985), eu e Tarcisão (Tarcísio Meira), numa cena de emboscada de madrugada, tínhamos que engatinhar com a faca entre os dentes. Numa pausa pedida pelo diretor, ouvi um som alto, como se estivessem mastigando pipocas. Aí um colega atrás de mim avisou: eu tinha parado em cima de um monte de cupim! Aguentei até o fim e, quando a câmera me deixou, fui arrancando toda a roupa, alucinadamente. Sou pródigo em pelos, então era uma centena de insetos agarrados ao meu corpo. Naquele frio, eu de sunga, começaram a me jogar água gelada. Ficou todo mundo rindo, eu também me diverti, mas soltei uns dois bons palavrões pro alto. Pelo menos não tivemos que refazer a cena... (risos)
Pode não parecer, mas fazer TV é arriscado, apesar de toda a segurança envolvida.
— Numa situação aparentemente inocente, como de dança, você pode se machucar feio. Eu caí duas vezes do cavalo em “Memorial de Maria Moura” (1994), e numa delas fraturei o cóccix. Na cena final de “Água viva” (1980), eu e Kadu Moliterno quase nos afogamos na praia do Leblon. De roupa, fomos puxados pelas ondas — conta Gloria, num papo por Zoom com Tony e o EXTRA.
Foi no alto de uma montanha rochosa na Grécia, depois de uma cansativa escalada para uma tomada ao pôr do sol, que Gloria Pires fez uma revelação a seu par de cena:
— Naquele lugar especial e tão improvável, tão perigoso, terminando uma novela longa e linda, me declarei a ele: estava realizando o sonho da minha mãe ao contracenar com Tony Ramos. Não deu tempo de ela ver (a também atriz Elza Pires morreu em 1993), mas foi incrível.
Após décadas de trabalhos na TV, foi só em “Belíssima” (2005) que o grande encontro dos atores, enfim, aconteceu.
— A ideia foi do (autor) Silvio de Abreu. Curiosamente, antes de a novela ir ao ar, rodamos o filme “Se eu fosse você”, com direção de Daniel Filho, que foi lançado um ano depois. Estar em cena com Glorinha foi sempre divertido e prazeroso — elogia o ator.
Na TV, a dupla ainda se encontrou em “Paraíso tropical” (2007), “Guerra dos sexos (2012) e “A grande família” (2014), quando viveu Lineu e Nenê no último episódio do seriado. Em breve, a celebrada parceria será renovada na novela de João Emanuel Carneiro, com título provisório de “Olho por olho”. Ambos serão antagonistas: ele, um empresário inescrupuloso; ela, uma mãe que rejeita a filha cega.
— Com os atrasos da pandemia, João Emanuel está mexendo mais na história. Recebemos a sinopse, mas não podemos falar muito. Só que a novela é, no mínimo, surpreendente — atiça Tony.
Personagens que marcaram épocas
Atores costumam dizer que personagens são como filhos: é difícil privilegiar um ou outro. Mas, num universo de dezenas deles, Gloria consegue eleger suas três prediletas:
— Maria de Fátima (“Vale tudo”, 1988), que viveu situações com que eu estava lidando, na minha vida pessoal, e foi uma catarse. As gêmeas Ruth e Raquel (“Mulheres de areia”, 1993), pela busca de ser igual sendo diferente. E Beatriz (“Babilônia”, 2015), por ser radicalmente oposta a mim. Ela trouxe à tona um lado sensual meu que eu nunca tinha trabalhado.
Tony, que diz ter contado 128 papéis em sua carreira, também já se multiplicou numa mesma trama, quando deu vida aos irmãos João Victor e Quinzinho, de “Baila comigo” (1981). Ele protagonizou o primeiro nu masculino em novelas, em “O astro” (1977).
— Convencer a censura de que aquela não era uma cena sensacionalista, e sim de voto à la São Francisco de Assis, foi poderoso — relembra ele, que, além de fazer, adora assistir a novelas: — Ah, eu estou louco pela volta de “Amor de mãe”!
Fonte: Jornal EXTRA
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